terça-feira, 6 de julho de 2010

Os laços de família unem ou dão nó?

Li em algum lugar que existem relações que duram o tempo de uma estação, outras duram uma vida toda. Desde pequena fui arredia. Ficava mais sozinha, quieta no meu canto, só observando. Achava as pessoas estranhas, mesmo da família. Era um mundo à parte. Muita confusão numa casa com dez pessoas. Sempre digo que a minha família é desunida pelos laços familiares. E afirmo que é dentro da família que começam todas as neuroses, a violência, a repressão, mas também o respeito, a cooperação, os limites. Hoje sei que a gente também traz algumas coisas de algum lugar e já chegamos com algumas “pré-disposições”.

Morar longe da família é muito bom. Acredito que todos deveriam, pelo menos uma vez nas suas vidas, se afastarem dos padrões familiares. Este afastamento nos torna mais vulneráveis e também abertos para outras realidades. Sempre falo dos samskaras, não é mesmo? É que a família e a sociedade são grandes fontes de samskaras, aquelas impressões que entram em nossa mente desde pequeninos. Samskaras não são apenas coisas ruins. O que somos é fruto de todas estas impressões. Só que têm coisas que não somos e continuamos acreditando porque alguém em algum momento disse que a gente era assim: feio ou bonito, chato ou bacana, covarde ou impulsivo. E isso a gente vai carregando como uma mochila nas costas, com estas coisas que não servem mais, como roupas de quando éramos bebes. E quando descobre que todo mundo passa por isso, acaba aquela velha mania de encontrar um culpado, que sempre é a mãe.

Sempre gostei de trabalhar, de aprender, e sonhava em ser executiva. Estudei, me formei em economia e trabalhei em grandes empresas. Mas sempre que podia mudava de emprego. Chegava um momento que eu perdia o interesse, ficava monótono, acabava o desafio. Então ficava no máximo de quatro a cinco anos nas empresas, para o desespero da minha mãe, cujo sonho era me ver estabilizada, casada e bem gorda. Então eu casei, estabilizei algum tempo, e fiquei gorda quando engravidei. Tudo durou dois anos e foi bom

Quando vim para Natal eu disse à minha mãe que fiquei 40 anos com ela (perto dela) e agora quero ficar os outros 40 comigo. Meio trágico não? É que chega um momento que já nem sabia quem eu era, perda total da identidade. Isto aconteceu também quando fiquei mãe. O primeiro ano eu me sentia uma teta de vaca! Eu adorei ser uma teta de vaca, pois fiz uma escolha: ficar um tempo em casa cuidando do filho. Entreguei-me tanto à maternidade e quem me conhecia não acreditava o que eu fazia, e hoje quando lembro, nem eu, pois fiquei dois anos criando a cria na linha da macrobiótica e da homeopatia. Não sei de onde tirei tanta paciência, mas a coisa de ser mãe é muito louca. Você se transforma.

Acredito que a maternidade foi o início do meu andar em direção ao Yoga, pois foi através dela que as transformações começaram a ocorrer em minha vida. A presença de outro ser, vindo direto da fonte, ilumina seu caminho e amplia as perspectivas de um mundo melhor. Foi o que aconteceu comigo! Acredito que foi Chris Griscom que disse que o potencial da mulher aumenta depois do parto, e dura uns dois anos, e que é a melhor fase para aproveitarmos as oportunidades que a vida tem a oferecer a quem se permite viver novas aventuras.

Para continuar este caminhar que leva ao autoconhecimento cometi algumas “insanidades” no olhar daqueles que vêm a vida com olhos cheios de preconceito. Mesmo assim sinto gratidão por todos que “permitiram” que eu desfrutasse desta aventura que é ficar só, como um retiro voluntário (será?).

Quanto à família, acredito mais nos laços do que nos nós, porque sinto que comecei a desfazer alguns. Acredito sim, nos laços que enlaçam feito os abraços dos meus familiares quando vou visitá-los. É isto que me alimenta e sustenta as minhas escolhas, mesmo as contraditórias e difíceis de serem aceitas. Minha família espera o retorno da filha pródiga e eu espero não precisar fazer isso porque tem caminhos que não tem volta e eu sinto que o meu é um desses. Mas como não tenho o total controle “entrego, confio, aceito e agradeço”, como escutei dos próprios lábios do Prof. Hermógenes no alto dos seus 90 anos esse mantra de sabedoria e lucidez.


"As coisas que amamos
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto.
Duram o infinito variável
no limite de nosso poder
de respirar a eternidade
Pensá-las é pensar que não acabam nunca,
dar-lhes moldura de granito.
De outra maneira se tornam absoluta
numa outra (maior) realidade.
Começam a esmaecer quando nos cansamos,
e todos nos cansamos, por um outro itinerário,
de aspirar a resina do eterno.*
Já não pretendemos que sejam imperecíveis.
Restituímos cada ser e coisa à condição precária
rebaixamos o amor ao estado de utilidade.
Do sonho eterno fica esse gozo acre
na boca ou na mente, sei lá, talvez no ar"

Carlos Drummond de Andrade

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