terça-feira, 6 de julho de 2010

Quem Precisa Salvar Quem?




Os grandes mestres nos ensinam que nossos pseudos martírios cotidianos são gotas de orvalho no coração da divindade, pois refresca e ilumina.

Sou abençoada desde o dia em que fui concebida pelos meus pais e todas as dificuldades me levaram ao caminho do autoconhecimento, mas nem sempre fui compreendida e aceita, e nunca perdi a oportunidade de me revoltar. Acho que ninguém está certo, nem eu e nem aqueles que contribuíram, mesmo dificultando, para que eu chegasse aqui. E um pouco de compaixão (karuna) não faz mal a ninguém, não é mesmo?

As grandes revoluções fazem a história mesmo as silenciosas, aquelas que você nem percebe que estão acontecendo. Eu penso que estas são as que realmente movem a roda e criam as condições para a felicidade plena.

As revoluções que estão registradas mostram uma parte das transformações. O que depois delas acontece ninguém sabe. Por isso que quando sinto algum alvoroço em meu coração, sei que algo vai acontecer. E em seguida vem uma coisa mais sublime, um grande alívio, mesmo que seja resultado de uma perda.

E foi justamente o que aconteceu em 2007, quando convidei meu sobrinho (aquele que é um rastro de luz) para morar uns tempos em Natal. Sempre tive isto de querer que as pessoas que gosto participem das boas coisas que eu desfruto, como o Yoga, estar próximo do mar, viver uma vida mais simples e contemplativa. Meu companheiro dizia que eu tinha síndrome de Madre Teresa de Calcutá. Quem me dera chegar aos pés dela, mas já recolhi muita gente na minha casa e no meu coração: amigos, gatos, pombo, namorados, ex-namorados, gente boa, gente nem tão boa assim...

Após o primeiro mês da vinda do meu sobrinho descobri que eu não seria mais a mesma, de novo. E quero escrever o que realmente aconteceu naquele mês, pois é uma das histórias mais lindas da minha vida. História de amor e desilusão. Prof. Hermógenes diz mais ou menos assim: Desiludiu-se? Que bom! Agora você está vendo a verdade!

Começou quando naquele ano fui à Curitiba e nos últimos dias da minha estada lá, reencontrei meu sobrinho que há muitos anos não via. É como se eu nunca o tivesse visto e o resultado foi uma poesia que eu reescrevo agora:

Hoje Deus me encontrou
Em roupas azuis de vários tons
Em meio a uma boina e uma barbicha
Ele se desvelou a mim Falou de amor e me fez chorar lágrimas de saudade
Trazendo a mais bela emoção e a mais vibrante canção
Confirmou a pureza, a beleza e a sua real natureza
Inundou de luz a minha alma sedenta
Com seu jeito meigo e verdadeiro
Cantamos juntos canções de outrora
Como se fôssemos velhos amigos relembrando
As poesias, os sons, as melodias
E no final nos abraçamos, eu em êxtase
Sem entender nada, mas com o coração feliz
E ainda por cima me chamou de tia!

Este reencontro mexeu muito comigo. E ficamos trocando e-mails até que ele decidiu vir para Natal. Foi uma mudança radical na sua vida, pois entrou em outro ritmo, fez muitas abstinências, não só de carne, mas de amigos, família, namorada, hábitos. E entrou de cabeça na minha vida, no Yoga. E depois de um mês ele teve uma experiência que levei alguns dias para enxergar. Os psicólogos transpessoais chamam de emergência espiritual, uma bad trip. Tenho certeza que ele não tomou nada, mas isto não importa. Tudo aconteceu muito rápido, para ele e para mim. Levei-o de volta à Curitiba com a ajuda de drogas lícitas, e que foi a coisa mais difícil de eu lidar, porque tive que embotá-lo, devido ao medo e à velha arrogância.


E é neste ponto que a história realmente começa, porque me vi totalmente perdida entre o Céu e a Terra, foi mais que um chute nos glúteos (melhorou?). Pensei que o Yoga me protegeria da minha arrogância, porque acreditei que eu poderia ser uma melhor solução para o meu sobrinho do que ele viver com meu irmão. O Yoga ia se encaixar no jeito que ele pensava. E foi quando percebi, sempre tarde demais, que as coisas não funcionam bem assim. Por um triz não larguei tudo, Chouprana, Natal, sonhos, etc. Mas acho que um pouco da minha arrogância se desfez e também um pouco de ilusão que criei em relação ao Yoga. E não porque esta via de evolução é perigosa, mas porque a minha mente é muito limitada. O Yoga nos propõe o tempo todo que para conhecermos a verdade (satya), precisamos ir além da mente. A mente é um macaco louco mordido por um escorpião dentro de uma loja de cristais. Olha só o estrago que fazemos quando apenas acreditamos nos nossos pensamentos, crenças e conceitos.

Depois de três anos desta experiência, meu sobrinho se recuperou, não toma drogas e continua sendo o ser de luz que sempre será. Ele nunca me condenou e nem o pai dele, mas o meu preconceito sim. Demorei alguns anos para perceber que somos parte da mesma existência e, ainda que distantes, respiramos o mesmo Prana, comungamos o mesmo Amor. Eu sei que o Yoga ainda continua vivo no coração dele e que em algum momento ele retornará com mais tranquilidade para permitir-se adentrar neste caminho.

Meses depois do que aconteceu, apareceu um rapaz bem jovem com um livro sobre Chakras nas mãos, para fazer uma aula de yoga. Percebi que ele não olhava direto nos meus olhos e que estava um pouco deslocado. Dei uma aula bem forte, para ver se ele aterrava. Ele voltou para a segunda aula e desta vez me confidenciou que tinha momentos que ele se sentia estranho quando estava numa roda de amigos. Perguntei a ele se os seus pais sabiam que estava fazendo Yoga. Disse que não. Pedi para que continuasse com a prática e deixasse de ler aquele livro por uns tempos. Mas ele não voltou! Pelo menos estou tentando ficar mais atenta.

Encontramos pessoas a todo instante
Encontrar Deus nas pessoas raramente
Muitas vezes não percebemos por falta de atenção
Outras porque as pessoas escondem o divino até delas mesmas
Por medo, por falta de confiança, por preguiça, muitas razões
Sentir a presença divina nas pessoas é como se apaixonar
Queremos estar com ela, ouvir o que ela tem a dizer
É mais que estar apaixonado
É sentir o amor incondicional
Ser tocado por Deus através da existência do outro
O nosso lado divino existe quando mostramos o nosso lado humano
Aberto, sem armaduras, despidos de preconceitos
Envolvidos em ternura.
Deus acabou de bater à minha porta e eu, por medo, não atendi!


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